A produção da nova versão de Vale Tudo optou por trocar um dos momentos mais simbólicos da novela — a saída do corpo de Odete Roitman do Copacabana Palace — pela recriação do ambiente nos Estúdios Globo. A decisão evidencia uma preocupação crescente: preservar o limite entre ficção e realidade sem comprometer a dramaticidade nem submeter o patrimônio histórico a mal‐entendidos.
A cena originalmente prevista para gravar no hotel carioca, local emblemático e reconhecido internacionalmente, seria marcada pela retirada de Odete e seu corpo. No entanto, a emissora entendeu que a imagem poderia gerar confusão: hóspedes poderiam registrar imagens da produção como algo verídico, com risco de viralização de falsos rumores sobre o que se passa ali, prejudicando a reputação do hotel além de gerar desgaste desnecessário para o conjunto cenográfico real.
Com isso, a maioria da sequência foi remanejada para estúdio, onde se espera que os luxuosos halls, corredores e interiores do Copacabana Palace sejam reconstruídos com fidelidade — inclusive para manter o impacto emocional desejado. Já as imagens externas, de suspeitos chegando ao hotel, continuam previstas para serem gravadas na própria fachada, preservando o diálogo com a paisagem real e o caráter icônico do prédio.
A decisão revela muito do momento atual da teledramaturgia: grande investimento técnico, sensibilidade ao real, cuidados de imagem institucional e consciência de que cada espaço público ou privado usado em tela carrega peso simbólico. Também mostra como, mesmo décadas depois da novela original, suas cenas-chave continuam a mobilizar expectativas e gerar tensão entre verossimilhança e efeitos práticos de produção.
Por trás da mudança, há um cálculo estratégico: manter o efeito de evento que Vale Tudo sempre foi. A morte de Odete Roitman é um marco histórico da televisão brasileira, uma cena ainda falada com o mesmo entusiasmo que, outrora, causou rebuliço nacional. Levantar o corpo de Odete no saguão do Copacabana Palace seria um momento alto de retorno emocional — mas um momento com riscos inesperados neste mundo de redes sociais e celulares onipresentes.
Gravar em estúdio permite controle absoluto: luzes, som, fluxo de pessoas, câmeras, ângulos — tudo coreografado para ressaltar tanto o drama quanto a estética que fez da novela original um clássico. E evita o tipo de imprevisto que, apesar de inofensivo em sua essência, pode repercutir mal fora da ficção. É uma medida de proteção que vai além do palco; fala ao momento de hiperexposição que vivemos.
Enquanto isso, telespectadores aguardam o desfecho: sabe-se que Odete morrerá em cena que consolidará o clímax da trama. Aceitarão os fãs a versão oficial, regravada nos estúdios, mesmo sabendo que parte da ficção teve de se reorganizar para não confundir o real? Resta ver se o público identificará a substituição — e se isso diminuirá ou reforçará o impacto dramático. A pergunta fundamental é: é possível recriar o icônico sem perder a chama que o tornou lendário? A produção aposta que sim.